Jus Civile #56

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Institutos

Sub-rogação

A dinâmica obrigacional comporta situações em que o pagamento da dívida não extingue o vínculo jurídico, mas o transfere a quem assumiu o encargo. É nesse contexto que se insere a sub-rogação, instituto regulado nos Arts. 346 a 351 do Código Civil. Por meio dela, o terceiro que satisfaz uma obrigação alheia assume a posição do credor originário, passando a deter o direito de cobrar o valor correspondente do devedor principal. Trata-se de um mecanismo de substituição subjetiva que preserva integralmente os elementos da obrigação, inclusive garantias e preferências creditórias, assegurando equilíbrio e justiça nas relações obrigacionais.

A sub-rogação pode ser legal ou convencional. A sub-rogação legal ocorre nas hipóteses previstas em lei — como no pagamento realizado pelo fiador, pelo segurador ou por um coobrigado que arcou com a totalidade da dívida comum. Já a sub-rogação convencional decorre de acordo entre o novo credor e o antigo, com anuência do devedor, sendo frequente em operações bancárias, financiamentos e renegociações de dívidas. Em ambos os casos, exige-se que o pagamento tenha sido legítimo, total ou parcial, e que o sub-rogado tenha interesse jurídico na preservação do crédito.

Pela sub-rogação, transfere-se o crédito com todos os seus acessórios, inclusive garantias reais, fidejussórias e preferência creditória. Dentre as hipóteses clássicas de sub-rogação legal, destacam-se:

  • O pagamento feito pelo fiador, que adquire o direito de regresso contra o afiançado;

  • O segurador que indeniza o segurado e se sub-roga nos direitos deste contra o causador do dano;

  • O coobrigado solidário que paga a totalidade da dívida comum.

A sub-rogação não se confunde com a cessão de crédito. Enquanto a cessão pressupõe acordo entre credor e cessionário, com ou sem ciência do devedor, a sub-rogação opera por efeito do pagamento, transmitindo o crédito de forma acessória e subsidiária. Também não se deve confundir com a assunção de dívida, que substitui o devedor, e não o credor. O elemento distintivo da sub-rogação está em sua função garantidora e no objetivo de preservar o direito de quem pagou por obrigação alheia, sem causar enriquecimento sem causa ao devedor.

Na prática forense, a sub-rogação é comum em execuções, ressarcimentos e disputas securitárias. Ignorar sua lógica pode significar a perda do direito de regresso ou a extinção de garantias relevantes. Ao operar com obrigações complexas, é indispensável conhecer esse instituto que, sem alterar o conteúdo do vínculo, muda quem detém o direito de cobrar — e assegura a quem pagou o justo retorno do que desembolsou.

Latim jurídico

Reformatio in pejus

A máxima reformatio in pejus exprime a vedação de que uma decisão seja reformada em prejuízo exclusivo do recorrente, nos casos em que apenas ele interpôs recurso. Trata-se de uma garantia do devido processo legal, prevista expressamente no Art. 1.013, §1º, do CPC, e que também encontra respaldo na jurisprudência consolidada.

A lógica por trás da regra é simples: quem não recorre, conforma-se com a decisão. Assim, o tribunal, ao julgar o recurso, não pode agravar a situação jurídica do recorrente, sob pena de violar o princípio da não surpresa e o contraditório. Apenas se houver recurso da parte contrária (ou recurso adesivo, nos termos do Art. 997, §2º), poderá haver rediscussão integral da matéria.

📌 Exemplo prático: Em uma ação de indenização, o autor obtém sentença que lhe concede R$ 20 mil, mas recorre pedindo majoração para R$ 50 mil. O réu, por sua vez, não interpõe recurso algum. Ao julgar a apelação, o tribunal não pode reduzir o valor da indenização para menos de R$ 20 mil, ainda que entenda que esse montante era excessivo. Fazer isso seria configurar reformatio in pejus, vedada porque só o autor recorreu.

Atualidades

STJ mantém criança com casal adotante em caso de adoção à brasileira

Imagem: Freepik

A Terceira Turma do STJ decidiu, no julgamento do HC 963.482/SP, que uma criança entregue informalmente a um casal aos cinco meses de vida — fora do Cadastro Nacional de Adoção — deve permanecer com os adotantes. A decisão reformou acórdão do TJSP que havia determinado a busca e apreensão da menor e seu acolhimento institucional, sob o argumento de que houve burla ao sistema formal de adoção.

A controvérsia envolveu um pedido de guarda provisória formulado em ação de adoção intuito personae, quando a mãe biológica indica diretamente quem deverá adotar o filho, fora da ordem de preferência prevista em cadastro público. Embora a prática seja criticada por não observar a fila de adoção, o STJ ponderou, no caso concreto, a necessidade de assegurar a estabilidade emocional e o bem-estar da criança.

Relator do habeas corpus, o Ministro Moura Ribeiro destacou que, embora o habeas corpus não seja o meio processual adequado para revisar decisões sobre guarda ou adoção, exceções são admitidas quando há risco evidente à liberdade ou à integridade da criança, permitindo a concessão da ordem de ofício.

O Tribunal reconheceu que, apesar da adoção ter se dado de forma informal, a criança já estava plenamente integrada ao ambiente familiar, sem qualquer indício de risco à sua integridade física ou emocional. Assim, o afastamento compulsório da menor para acolhimento institucional, como determinado pelo TJSP, violaria o princípio da intervenção mínima do Estado na esfera familiar.

A decisão reacende o debate sobre a chamada adoção à brasileira, expressão utilizada para descrever a prática pela qual uma criança é entregue diretamente a terceiros, sem a devida formalização judicial. Embora o procedimento contrarie as diretrizes legais — inclusive podendo caracterizar infração administrativa ou penal em determinadas circunstâncias — o STJ tem reiteradamente afirmado que a realidade afetiva e a proteção integral da criança devem prevalecer diante da rigidez procedimental, sobretudo quando não há má-fé nem risco ao menor.

Nesse sentido, a Terceira Turma reforçou que a institucionalização da criança deve ser medida excepcional, aplicável apenas na ausência de alternativas familiares viáveis. Como não havia sinais de negligência, violência ou omissão por parte dos adotantes, sua manutenção no núcleo familiar foi considerada mais adequada do que a ruptura abrupta do vínculo afetivo estabelecido.

Sob a ótica constitucional, a decisão do STJ revela um tensionamento legítimo entre dois valores fundamentais: a legalidade estrita do processo de adoção e o princípio do melhor interesse da criança, consagrado no Art. 227 da Constituição e no Estatuto da Criança e do Adolescente.

Embora não se ignore o risco de precedentes que possam estimular a informalidade e a burla à fila de adoção, a Corte agiu com sensibilidade ao reconhecer que nem toda irregularidade formal justifica a supressão de vínculos afetivos consolidados. O precedente reforça que o Judiciário deve olhar para o caso concreto com atenção à realidade empírica e não apenas à normatividade abstrata.

InovAção

Engenharia de prompt: elaboração de contrato de compra e venda de imóvel com due diligence

O contrato de compra e venda de imóvel é um dos instrumentos mais sensíveis na advocacia cível. Envolve patrimônio elevado, riscos cartorários, passivos ocultos e, não raro, disputas judiciais posteriores. A tecnologia, nesse campo, não substitui o raciocínio jurídico — mas pode ampliar a produtividade e a segurança do profissional quando usada com precisão.

Nesta edição, apresentamos um prompt avançado para uso com ferramentas de IA generativa, voltado à elaboração de contratos imobiliários sob medida. A proposta vai além de simplesmente gerar um texto genérico: o prompt foi pensado para simular o comportamento de um advogado imobiliário sênior, que primeiro conduz uma due diligence criteriosa e, só então, estrutura a minuta contratual com base nas informações recebidas.

Abaixo, você confere o modelo completo, pronto para ser utilizado em plataformas como ChatGPT, Claude, Gemini ou outras IAs que operam via linguagem natural:

🧠 Prompt para Elaboração de Contrato de Compra e Venda de Imóvel — com Due Diligence Imobiliária

📌 Papel (Role)

Você é um advogado especialista em Direito Imobiliário, com vasta experiência em negociações complexas de bens urbanos e rurais, titular de um escritório reconhecido por sua atuação estratégica na regularização de imóveis, estruturação de contratos e análise de riscos patrimoniais.

🎯 Tarefa (Task)

Sua missão é elaborar um contrato de compra e venda de imóvel sob medida, com linguagem técnica, cláusulas claras e estrutura jurídica adequada. Antes disso, deverá realizar um processo de due diligence documental, a fim de mapear riscos e verificar a viabilidade jurídica da transação.

Para isso, siga os seguintes passos:

1.      Solicite ao usuário todas as informações relevantes do negócio, incluindo:

o    Qualificação completa das partes;

o    Endereço e características do imóvel;

o    Valor do negócio e forma de pagamento;

o    Existência de financiamento, sinal ou parcelamento;

o    Dados do registro imobiliário (matrícula, número do cartório, existência de ônus ou gravames);

o    Situação da posse e ocupação atual;

o    Existência de contrato de promessa de compra e venda anterior;

o    Necessidade de cláusulas específicas (reserva de domínio, imissão na posse, condição suspensiva ou resolutiva, entre outras).

2.      Pergunte também sobre a documentação disponível para a análise prévia:

o    Certidões negativas (municipais, estaduais, federais, de protesto e de ações judiciais);

o    Cópia atualizada da matrícula do imóvel;

o    Certidões do vendedor (CPF/CNPJ, ações, execuções fiscais etc.);

o    Documentos da edificação (habite-se, averbações, planta aprovada, convenção de condomínio, se for o caso).

3.      Com base nas informações recebidas, elabore o contrato com:

o    Estrutura técnica (preâmbulo, cláusulas obrigacionais, garantias, tributos, posse, penalidades, foro etc.);

o    Linguagem jurídica precisa, com fundamentação no Código Civil e na Lei de Registros Públicos;

o    Previsão de riscos e salvaguardas contratuais em favor do comprador e/ou vendedor, conforme o caso;

o    Estilo claro e formal, próprio de contratos solenes, com atenção ao equilíbrio das partes.

🧷 Especificações (Specifics)

·         Siga os padrões da prática contratual brasileira;

·         Fundamente cláusulas críticas (como cláusula penal, inadimplemento, obrigações acessórias) com base legal, se pertinente;

·         Utilize terminologia jurídica adequada ao Direito Imobiliário;

·         Evite jargões excessivos, mas mantenha o rigor técnico;

·         Não avance na minuta contratual sem antes obter todos os dados do item 1;

·         Informe o usuário sempre que detectar riscos ou inconsistências nos dados fornecidos.

🧩 Contexto (Context)

Você atua como consultor jurídico especializado, responsável por estruturar contratos de compra e venda de imóveis urbanos e rurais para diversos perfis de clientes (pessoas físicas, incorporadoras, fundos, herdeiros, empresas). Seu papel vai além da minuta: envolve a prevenção de litígios, a proteção patrimonial e a conformidade registral do negócio.

🧪 Exemplo prático (Example)

Q: Preciso elaborar um contrato de compra e venda de um apartamento financiado, com cláusula de imissão na posse.
A: Certo. Para elaborar corretamente, preciso que você me informe:

·         Qualificação completa do comprador e do vendedor;

·         Dados do imóvel e da matrícula;

·         Valor da transação e condições do financiamento;

·         Se há saldo devedor vinculado ao imóvel;

·         Data prevista para a posse e eventual uso da cláusula de imissão antecipada;

·         Certidões disponíveis e regularidade registral;

·         Se deseja incluir cláusula penal ou condição resolutiva.

Após receber essas informações, elabore o contrato com todas as garantias jurídicas cabíveis, respeitando a legislação aplicável e as especificidades do caso.

Mais do que gerar textos, a engenharia de prompt aplicada ao Direito permite orientar a IA para atuar com critério técnico e abordagem jurídica compatível com a prática real. O modelo acima é uma amostra de como a tecnologia pode ser integrada à rotina do advogado de forma eficaz — sem abrir mão do controle profissional sobre a estrutura e o conteúdo da peça.

Mais uma Jus Civile concluída com sucesso! Se em algum momento desta edição você pensou “alguém precisava ler isso”, siga o seu impulso: compartilhe a newsletter. Isso nos ajuda muito mais do que você imagina. Até a próxima!🦉📚

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