Jus Civile #55

Mais uma quarta-feira, mais uma edição da Jus Civile. O excesso de conteúdo não deveria substituir a profundidade. Aqui, seguimos priorizando o que faz diferença na prática. Boa leitura! 🦉

Institutos

Simulação

O Direito Privado reconhece a autonomia das partes para livremente celebrarem negócios jurídicos — mas apenas enquanto essa autonomia for exercida de forma legítima, transparente e conforme a função social do ato. A simulação surge exatamente quando as partes utilizam a linguagem formal do Direito para encobrir a realidade de suas intenções, criando aparência de um negócio que, de fato, não corresponde à vontade real ou que oculta outra operação distinta. Trata-se de um vício social do ato jurídico que, conforme dispõe o Art. 167 do Código Civil, acarreta a sua nulidade.

A simulação pode se manifestar de diferentes formas:

  • Simulação absoluta, quando o negócio celebrado não visa a produzir efeito algum (como uma venda fictícia para afastar penhora);

  • Simulação relativa, quando se oculta a verdadeira operação realizada (como uma doação disfarçada de compra e venda);

  • Simulação parcial, quando apenas um elemento do negócio é simulado (como o valor da transação).

Em qualquer das hipóteses, a consequência jurídica é a nulidade do negócio simulado, ainda que celebrado com aparência formal válida. A lógica da sanção é clara: o ordenamento não protege negócios fundados na fraude, na dissimulação ou no abuso da forma jurídica. No entanto, o parágrafo 1º do Art. 167 admite a preservação do negócio oculto quando este for válido em substância e forma, desde que não infrinja a lei ou o interesse de terceiros de boa-fé. Nessa hipótese, a nulidade recairá sobre o ato simulado, mas não sobre a relação efetivamente pretendida pelas partes, caso esta seja lícita.

A distinção entre simulação e outros vícios — especialmente o erro, o dolo e a fraude contra credores — exige atenção. A simulação é sempre bilateral (ou plurilateral), pois pressupõe o conluio entre as partes para criar aparência enganosa. Já o erro e o dolo ocorrem, em regra, de modo unilateral, com vício de consentimento.

A identificação do negócio simulado pode se dar por meio de elementos extrínsecos à formalidade do instrumento. Provas documentais, circunstanciais e até testemunhais podem ser utilizadas para demonstrar que a operação jurídica foi utilizada para fins diversos dos declarados — o que frequentemente ocorre em litígios sucessórios, ações de anulação, disputas familiares e dissoluções societárias.

A simulação é vício que atinge a própria essência do ato jurídico, retirando-lhe a eficácia e a validade, e pode ser alegada por qualquer interessado ou reconhecida de ofício pelo juiz.

Ao advogado que atua em Direito Civil, é essencial conhecer os contornos do instituto — tanto para impugnar atos que ocultam intenções ilícitas quanto para evitar que instrumentos contratuais adotados por seus clientes sejam posteriormente invalidados por vício de simulação. Em um sistema fundado na confiança e na boa-fé, a forma não pode servir de escudo para a fraude: é o conteúdo que deve prevalecer.

Latim jurídico

Inter partes

A expressão inter partes indica que determinado efeito jurídico vincula apenas as partes envolvidas em um negócio ou processo, em contraste com os efeitos erga omnes, que atingem terceiros. Trata-se de uma distinção fundamental no Direito, especialmente para delimitar a eficácia das decisões judiciais, das convenções privadas e de outros atos jurídicos.

Em regra, sentenças proferidas no processo civil produzem efeitos apenas inter partes (Art. 506 do CPC). O mesmo se aplica aos contratos, cujos efeitos obrigacionais não alcançam terceiros estranhos à relação jurídica. Assim, a cláusula contratual ou a condenação imposta em juízo não pode prejudicar quem não integrou o negócio ou o processo.

📌 Exemplo prático: duas empresas firmam contrato de prestação de serviços com cláusula de exclusividade. Mais tarde, uma delas celebra contrato semelhante com um terceiro. Este terceiro, porém, não participou do acordo inicial, e tampouco pode ser responsabilizado por sua violação. A cláusula de exclusividade produz efeitos apenas inter partes — ou seja, entre os contratantes originais —, não vinculando terceiros que não tenham anuído ao pacto.

Atualidades

STJ valida arresto on-line antes da citação se devedor não for localizado

Imagem: Jus Civile

Em importante precedente que impacta diretamente a efetividade da execução, a Terceira Turma do STJ decidiu, no REsp 1.822.034/SC, que é admissível o arresto executivo de valores por meio eletrônico mesmo antes da citação do devedor, desde que ele não tenha sido encontrado para ser citado.

O julgamento reforma entendimento do TJSC, que havia exigido o esgotamento das tentativas de citação pessoal para autorizar a medida. Para o STJ, tal exigência é indevida, pois a não localização do devedor já configura o único requisito necessário ao arresto executivo, nos termos do Art. 830 do CPC.

A relatora, Ministra Nancy Andrighi, destacou a distinção entre o arresto cautelar (Art. 301 do CPC), que exige demonstração de probabilidade do direito e perigo de dano, e o arresto executivo (Art. 830 do CPC), que possui finalidade distinta: assegurar a futura efetivação da penhora quando o devedor não é localizado para citação.

Ao aplicar analogia com o Art. 854 do CPC, que permite a penhora eletrônica de valores sem prévia ciência do devedor, o STJ reconheceu que, diante da frustração da citação pessoal, é legítima a constrição de ativos financeiros via SISBAJUD como medida de arresto, para prevenir a frustração do crédito.

O acórdão reafirma a orientação da Corte no sentido de que não há vedação legal ao arresto eletrônico, mesmo que o CPC não trate expressamente da modalidade on-line para esse fim. A Corte reforçou que o sistema SISBAJUD pode ser usado como instrumento de pré-penhora, desde que o executado esteja em local incerto ou não sabido.

Além disso, a decisão invocou o princípio da efetividade da execução (Art. 797 do CPC), segundo o qual o processo executivo deve ser conduzido no interesse do credor. A citação não é requisito para o arresto — ela é apenas necessária para a conversão da medida em penhora, quando for possível.

O precedente é especialmente relevante para ações de execução contra devedores que evitam a citação para frustrar a constrição patrimonial. A decisão reconhece que a busca por bens via sistemas eletrônicos é compatível com o modelo processual contemporâneo, que privilegia instrumentos eficazes de tutela jurisdicional.

Na prática, a decisão facilita medidas coercitivas e preventivas contra devedores que se ocultam, agiliza a tramitação da execução e reforça a segurança jurídica da atividade bancária e empresarial.

Análise crítica da decisão: o acórdão reafirma uma interpretação moderna e sistemática do processo de execução, compatível com os meios digitais de constrição e com o ideal de acesso efetivo à jurisdição. Ao reconhecer que a citação não é requisito para o arresto on-line, o STJ evita o uso abusivo da ausência de domicílio conhecido como escudo contra a satisfação do crédito.

No entanto, o precedente também exige parcimônia na sua aplicação, para que não se banalize a exceção em prejuízo das garantias processuais do executado. O não encontro para citação deve ser devidamente comprovado, e a medida deve ser sempre motivada e proporcional, sob pena de violação ao devido processo legal.

InovAção

SJinn: agente inteligente para criação multimídia com IA

A SJinn.ai é uma plataforma baseada em inteligência artificial voltada à criação automatizada de conteúdos multimídia — imagens, vídeos, áudios e até modelos 3D — a partir de simples comandos de texto. Diferentemente de ferramentas especializadas em apenas um formato, a proposta do SJinn é integrar todo o fluxo criativo em uma única interface, permitindo que profissionais de diferentes áreas — inclusive do Direito — explorem a comunicação de forma mais dinâmica e visual.

Com uma interface simples e recursos organizados por templates prontos, a plataforma permite que o usuário produza desde vídeos explicativos e clipes de voz até animações e peças visuais, bastando descrever o conteúdo desejado. Os planos variam conforme o número de créditos utilizados por mídia gerada, com opções para uso individual e empresarial.

Embora não seja voltada ao uso técnico-jurídico, a SJinn pode ser explorada por advogados e escritórios como ferramenta de comunicação institucional. Entre os usos mais promissores estão:

  • Criação de conteúdos informativos para redes sociais, com linguagem acessível e apoio visual;

  • Geração de vídeos curtos explicativos sobre temas como contratos, direitos do consumidor, planejamento sucessório etc.;

  • Produção de materiais para campanhas de compliance, educação corporativa ou marketing jurídico;

  • Elaboração de áudios e vídeos com vozes geradas por IA para publicações automatizadas, treinamentos internos ou apresentações comerciais;

  • Composição de imagens para eBooks, newsletters ou apresentações de propostas para clientes.

Em um mercado cada vez mais sensível à linguagem visual e à narrativa digital, o SJinn pode ser um aliado valioso para traduzir o conhecimento jurídico em formatos mais engajadores, desde que usado com responsabilidade, especialmente quanto à veracidade e adequação das mensagens.

A SJinn.ai não substitui ferramentas jurídicas, mas amplia o alcance da comunicação do advogado moderno. Sua aplicação prática está no campo da informação, da visibilidade e da didática, tornando mais fluida a conexão entre o Direito e a sociedade — um diferencial para quem deseja inovar no modo de apresentar ideias jurídicas ao público.

Encerramos esta edição com a certeza de que boas ideias se sustentam melhor quando compartilhadas. Se esta leitura te foi útil, passe adiante. A Jus Civile cresce com a indicação de quem acredita no valor do conteúdo jurídico de qualidade. Até a próxima! 🦉📚

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