- Jus Civile
- Posts
- Jus Civile #48
Jus Civile #48

O excesso de informação não é o mesmo que conhecimento. Nesta edição, filtramos o ruído para destacar o que realmente importa. A clareza é o nosso critério. A análise, o nosso compromisso. Pegue um café e boa leitura! 🦉
Institutos
Prova emprestada
O processo civil, embora marcado por princípios de contraditório, ampla defesa e produção de provas nos autos, admite que, em determinadas circunstâncias, elementos probatórios colhidos validamente em outro feito judicial possam ser utilizados em nova demanda. É o que se convencionou chamar de prova emprestada, instituto não positivado no Código de Processo Civil, mas amplamente admitido pela doutrina e jurisprudência como expressão da cooperação entre jurisdições, da busca pela verdade real e da economia processual.
Admite-se a utilização da prova emprestada sempre que a origem da prova for lícita, legítima e compatível com os princípios processuais vigentes, e, sobretudo, desde que assegurado o contraditório às partes no processo destinatário. Não basta que a prova exista: é necessário que as partes possam se manifestar sobre ela, sob pena de nulidade. A exigência do contraditório, nesse contexto, é uma reiteração da máxima processual de que ninguém deve ser surpreendido por elementos que não pôde debater.
Entre as hipóteses mais recorrentes de utilização da prova emprestada, destacam-se:
Processos cíveis que aproveitam provas colhidas em ações penais conexas;
Demandas trabalhistas que se valem de relatórios ou laudos produzidos em ações civis públicas;
Execuções cíveis ou fiscais que utilizam documentos juntados em outros feitos judiciais entre as mesmas partes.
‼️É indispensável que a prova tenha sido produzida sob a égide do contraditório e que a parte contra quem será utilizada tenha participado (ou ao menos podido participar) do processo de sua formação.
A prova emprestada não se confunde com a mera juntada de cópias de processos judiciais. Para que produza efeitos válidos, é necessário que seja requerida sua utilização de modo fundamentado, e que o juízo oportunize a manifestação da parte contrária.
O instituto, embora acolhido de forma pragmática pela jurisprudência, não está isento de críticas. Há autores que questionam sua compatibilidade com a rigidez da legalidade processual, bem como os riscos de uso descontextualizado de provas. Ainda assim, tem-se consolidado a compreensão de que, desde que respeitado o contraditório, a prova emprestada é expressão legítima de um processo civil mais funcional e integrado.
Latim jurídico
Ultra petita
A expressão ultra petita refere-se à hipótese em que o julgador concede algo além do que foi pedido pela parte no processo. Em termos processuais, trata-se de uma ofensa ao princípio da congruência ou da adstrição ao pedido, segundo o qual o juiz deve decidir a lide nos limites em que foi proposta (Art. 492 do CPC).
Decisões ultra petita comprometem a segurança jurídica e o contraditório, pois impõem à parte vencida uma condenação sobre questão que ela não teve oportunidade de se defender. É diferente do julgamento extra petita (fora do pedido) ou citra petita (a menor do que foi pedido), todos vícios que podem ensejar nulidade da sentença, parcial ou total.
📌Exemplo prático: em uma ação de cobrança, o autor pleiteia o pagamento de R$ 50.000,00 com juros legais desde a citação. O juiz, ao sentenciar, condena o réu a pagar R$ 70.000,00 com juros desde a data do contrato. Ao majorar o valor e alterar o termo inicial dos juros sem que isso tenha sido requerido, a sentença extrapola os limites da demanda — configurando julgamento ultra petita, passível de reforma em grau recursal.
Atualidades
Honorários advocatícios são cabíveis se desconsideração da personalidade jurídica for negada, decide STJ

Imagem: Freepik
No julgamento do EREsp 2.042.753/SP, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça firmou importante tese para a advocacia contenciosa: é cabível a fixação de honorários advocatícios quando o pedido de desconsideração da personalidade jurídica é indeferido, desde que tal decisão represente alteração substancial da lide.
A controvérsia teve origem em embargos de divergência interpostos contra acórdão da Terceira Turma, que havia reconhecido a legitimidade da condenação em honorários sucumbenciais em favor do advogado do sócio indevidamente incluído no polo passivo da demanda, após o indeferimento do incidente de desconsideração.
⚖️Tese fixada pela Corte Especial: “A fixação de honorários advocatícios é cabível em incidentes processuais que resultem em alteração substancial da lide, como no indeferimento do pedido de desconsideração da personalidade jurídica.”
A decisão foi unânime e reafirma a jurisprudência segundo a qual a fixação de honorários em incidentes processuais não depende da designação formal do ato, mas sim de sua capacidade de interferir no mérito da causa. Nos termos do voto do relator, essa compreensão é compatível com o princípio da causalidade (Arts. 85 e 86 do CPC/2015), bem como com o direito do advogado à retribuição pela atuação exitosa (Arts. 22 e 23 da Lei 8.906/94).
O precedente tem repercussão direta nas estratégias processuais adotadas pelas partes em execuções e ações de cobrança. A tentativa indiscriminada de inclusão de sócios ou terceiros por meio do incidente de desconsideração passa agora a implicar risco financeiro concreto para a parte requerente, que poderá ser condenada ao pagamento de honorários sucumbenciais em caso de insucesso.
Para o advogado que representa o sócio indevidamente incluído, a decisão do STJ reforça o reconhecimento da atuação técnica como elemento de resistência legítima, conferindo-lhe a justa contrapartida em honorários quando for vitorioso. Essa orientação também dialoga com o princípio da causalidade, reafirmando que a parte que dá causa à instauração de incidente infundado deve arcar com os ônus decorrentes da sucumbência parcial.
Sob o ponto de vista sistemático, a decisão da Corte Especial é coerente com a evolução jurisprudencial que reconhece a autonomia e a relevância dos incidentes com potencial decisório substancial. Ao equiparar os efeitos de um indeferimento de desconsideração à exclusão de litisconsorte por mérito, o STJ reconhece o caráter substancial da controvérsia e afasta a aplicação meramente formal da regra que veda honorários em interlocutórias.
No entanto, o julgado também impõe maior responsabilidade às partes que manejam o incidente de forma estratégica, por vezes como instrumento de pressão econômica sobre pessoas físicas. A nova diretriz contribui para o amadurecimento do sistema, mas requer dos juízes sensibilidade na análise do grau de complexidade e da boa-fé da parte requerente, a fim de evitar o uso dissuasório da condenação em honorários como forma de cerceamento à ampla defesa e ao acesso à justiça.
InovAção
Promptessor: refinamento estratégico de prompts para uso profissional
A engenharia de prompt deixou de ser um exercício de tentativa e erro para se tornar uma competência estratégica — especialmente em ambientes jurídicos que utilizam inteligência artificial na elaboração de peças, pareceres ou pesquisas jurisprudenciais. Nesse contexto, a ferramenta Promptessor se destaca como um refinador inteligente de comandos: em vez de gerar textos, ela analisa, estrutura e sugere melhorias para prompts, contribuindo para a precisão e profundidade das respostas obtidas em modelos como ChatGPT, Claude ou Gemini.
O foco da plataforma é a qualidade do input. A ideia central é simples: quanto melhor o comando, mais útil será a resposta. Para isso, o Promptessor oferece um ambiente onde o usuário insere seu prompt original e recebe, em troca, uma análise detalhada com sugestões concretas — seja para torná-lo mais claro, mais completo ou mais alinhado ao papel esperado da IA.
Entre os principais recursos, destaca-se o sistema de feedback estruturado, que avalia a clareza do pedido, a definição de papéis, o uso de contexto e a especificidade das instruções. Além disso, a ferramenta mantém um histórico de versões, permitindo ao usuário acompanhar como as alterações no prompt afetam o comportamento da IA.
Outro ponto positivo é o seu viés educacional: mais do que corrigir prompts, o Promptessor ensina. Cada sugestão vem acompanhada de explicações, o que transforma a ferramenta em uma espécie de mentor de engenharia de prompt.
No entanto, há algumas desvantagens. A plataforma não gera respostas: ela apenas refina o comando que será posteriormente usado em outro ambiente. Ou seja, é necessário copiar o prompt aprimorado e colá-lo no modelo de IA de sua preferência. Essa ausência de integração direta pode fragmentar o fluxo de trabalho. Além disso, embora sua interface seja relativamente amigável, há uma curva de aprendizado inicial para compreender e aplicar corretamente as sugestões oferecidas.
Outro ponto a se considerar é que, embora o site mencione compatibilidade com múltiplos idiomas, não há clareza sobre a qualidade da análise em português. Usuários brasileiros podem encontrar pequenas limitações, principalmente em sugestões mais estilísticas ou linguísticas.
Ainda assim, a Promptessor tem se consolidado como uma ferramenta robusta e confiável para quem busca profissionalizar a forma como interage com inteligências artificiais. Em especial, pode ser uma excelente aliada na construção de prompts voltados à produção de peças jurídicas complexas, como recursos, pareceres, petições e manifestações técnicas, desde que combinada com uma plataforma generativa de texto.
Em resumo: o Promptessor representa uma abordagem madura e analítica da engenharia de prompt. Seu diferencial está em oferecer feedback técnico, histórico de versões e aprimoramento iterativo, que favorecem um uso mais consciente e eficaz das IAs. Para o operador do Direito, pode ser a ponte entre a intenção do comando e a exatidão da resposta.
Obrigado por caminhar conosco em mais uma edição. Se este conteúdo te ajudou a pensar melhor o Direito, compartilhe a Jus Civile com quem também aprecia boas leituras. É simples, gratuito — e faz toda a diferença. Até a próxima semana! 🦉📚
Reply