- Jus Civile
- Posts
- Jus Civile #33
Jus Civile #33

Começamos mais uma edição da Jus Civile com o compromisso de sempre: oferecer conteúdo jurídico claro, atual e tecnicamente relevante. A edição nº 33 traz discussões que merecem atenção – afinal, quem atua com seriedade no Direito sabe que estar bem informado faz parte do ofício. Vamos juntos? ⚖️📖
Institutos
Direito de regresso
O direito de regresso consiste na possibilidade de uma pessoa, após ter indenizado um dano causado por outrem, requerer o ressarcimento daquele que efetivamente deu causa ao evento danoso. A previsão legal consta no Art. 934 do Código Civil.
No contexto do direito de regresso, é possível identificar duas figuras centrais: o agente que exerce o direito de regresso (ou regressante) e o agente regressado, que é aquele a quem se atribui a responsabilidade direta pelo dano. O regressante é, em regra, aquele que, por força de lei ou decisão judicial, realizou o pagamento da indenização sem ter sido o único autor do fato gerador do dano, enquanto o regressado é o sujeito que efetivamente causou ou concorreu com o prejuízo e, portanto, responde regressivamente pela reparação efetuada por outrem. A ação regressiva tem, portanto, natureza indenizatória e visa recompor o patrimônio do regressante, que suportou uma obrigação jurídica alheia.
A dinâmica do instituto pode ser vislumbrada, por exemplo, em relações jurídicas nas quais uma parte responde objetivamente ou de forma subsidiária, como nos casos previstos no Art. 932 do Código Civil, a exemplo da responsabilidade de empregadores, por atos de seus empregados, e do Estado, por atos de seus agentes. Também é recorrente em situações de responsabilidade solidária, em que um dos devedores satisfaz a obrigação integral e, posteriormente, busca o reembolso da quota-parte dos demais corresponsáveis pela dívida.
O exercício do direito de regresso pressupõe que:
Haja pagamento efetivo de indenização por aquele que busca o reembolso.
O agente regressado seja responsável direto pelo dano.
O pagamento tenha sido feito de maneira lícita e proporcional.
Não exista exclusão contratual ou legal do direito de regresso.
Importante observar que, mesmo nos casos em que a responsabilidade é objetiva (isto é, sem culpa), o regresso dependerá da demonstração de dolo ou culpa do agente regressado, sob pena de o responsável final ser condenado a pagar pela conduta alheia sem a possibilidade de reembolso.
Latim jurídico
Vexata quaestio
A locução latina vexata quaestio pode ser traduzida como “questão controvertida” ou “questão tormentosa”, sendo utilizada no meio jurídico para designar temas recorrentes, de difícil solução e marcados por longa controvérsia doutrinária ou jurisprudencial.
Em geral, a expressão aparece em decisões judiciais, pareceres ou textos doutrinários para indicar que determinada matéria já foi amplamente debatida, sem que se tenha chegado a um entendimento pacífico. Embora não interfira diretamente no desfecho de um caso, seu uso sinaliza a complexidade e o histórico de divergência que envolvem a questão jurídica analisada.
📌 Exemplo prático: a discussão sobre a possibilidade de cumulação de lucros cessantes com cláusula penal é frequentemente tratada como uma vexata quaestio, pois há entendimentos divergentes quanto à sua admissibilidade, tanto na doutrina quanto nos tribunais superiores.
A utilização da expressão não implica necessariamente ausência de solução, mas indica que, historicamente, trata-se de matéria que desafia interpretações unívocas e que, muitas vezes, depende da consolidação de jurisprudência ou do enfrentamento em sede de recursos repetitivos ou repercussão geral.
Atualidades
STJ admite quebra de sigilo fiscal e bancário em ação de alimentos

Imagem: Freepik
Em recente decisão (REsp nº 2126879/SP), o STJ reafirmou a possibilidade de quebra de sigilo fiscal e bancário do alimentante em ação de oferta de alimentos, desde que presentes elementos que justifiquem a medida sob a ótica do princípio do melhor interesse do menor e do adequado dimensionamento do binômio necessidade-possibilidade.
O caso analisado envolvia genitor que, ao propor ação de oferta de alimentos, teve determinada, na fase de saneamento, a realização de diligências junto aos sistemas Sisbajud, Renajud e Infojud, com a finalidade de apurar sua real condição econômica. Inconformado, sustentou que a medida seria desnecessária e violadora do sigilo previsto na Lei Complementar nº 105/2001, alegando já ter comprovado seus rendimentos.
O STJ, contudo, manteve a decisão que autorizou a quebra dos sigilos, entendendo que, diante da controvérsia relevante sobre a capacidade financeira do alimentante, e considerando indícios de rendimentos não refletidos nos documentos apresentados, a medida seria proporcional e adequada para elucidar os fatos.
O voto condutor destacou que o sigilo bancário e fiscal, embora revestido de proteção constitucional, não possui caráter absoluto, podendo ser relativizado diante de outro direito fundamental – no caso, o direito à alimentação e à dignidade da criança, que depende de correta apuração da possibilidade econômica do provedor.
A decisão ressalta, ainda, que a medida excepcional somente se justifica na ausência de outros meios menos invasivos para obtenção dos dados necessários, e quando a instrução do processo exige esclarecimentos objetivos sobre a realidade patrimonial das partes.
📌 Análise crítica: apesar da justificativa baseada no melhor interesse do menor, a autorização para quebra de sigilo bancário e fiscal em ação de oferta de alimentos — proposta voluntariamente pelo próprio alimentante — levanta questionamentos relevantes sob a ótica da segurança jurídica e da proteção à privacidade. A medida, embora excepcional, relativiza um direito fundamental expressamente protegido pela Constituição e pela Lei Complementar nº 105/2001, e pode abrir precedentes para flexibilizações excessivas. Além disso, ainda que o processo tramite sob segredo de justiça, os dados obtidos tornam-se acessíveis a diversos atores processuais, ampliando o risco de exposição indevida. A falta de critérios objetivos para delimitar essas autorizações também contribui para um cenário de insegurança jurídica, exigindo do Judiciário maior cautela e rigor na fundamentação dessas decisões.
InovAção
Lovable: criação de sites jurídicos com IA
A manutenção de uma presença digital eficiente deixou de ser facultativa para advogados e escritórios. Diante disso, surgem ferramentas baseadas em inteligência artificial voltadas à criação automatizada de sites jurídicos, como é o caso da plataforma Lovable. A proposta é reduzir drasticamente os custos e o tempo envolvidos na publicação de páginas institucionais, permitindo que o profissional do Direito foque no conteúdo e na estratégia, sem precisar dominar aspectos técnicos de programação ou design.
A Lovable é uma plataforma que constrói sites automaticamente a partir de uma interação textual com o usuário. O processo começa com o fornecimento de um briefing textual detalhado, que funciona como um comando inicial para a IA. Com base nesse direcionamento, a ferramenta gera:
Estrutura do site (layout, seções, menus).
Conteúdo textual coerente com a área de atuação informada.
Estética visual adaptável à identidade desejada.
Um bom resultado depende de um comando inicial bem formulado. Ao invés de utilizar instruções vagas como “quero um site para meu escritório”, recomenda-se um direcionamento mais específico. Veja um exemplo:
“Crie um site de página única para meu escritório de advocacia. O site deve incluir uma introdução profissional, apresentação dos principais serviços nas áreas de Direito Civil, informações sobre minha formação e experiência, um formulário de contato simples e uma paleta de cores sóbria, com fundo claro e tipografia tradicional.”
A partir disso, é possível refinar a estrutura criada por meio de solicitações diretas à IA, como alteração de cores e fontes, inclusão de símbolos jurídicos e criação de seções adicionais, como depoimentos ou artigos.
A versão gratuita possui limitações de uso diário e recursos, mas pode ser útil para fins exploratórios ou prototipagem de landing pages.
Para advogados que desejam testar novas formas de apresentação digital — como páginas voltadas a nichos específicos de atuação ou campanhas temáticas — a Lovable representa uma solução funcional. Ainda que a plataforma não dispense revisões e adaptações, ela pode servir como ponto de partida válido, especialmente em contextos de baixo orçamento ou para escritórios em fase inicial.
A experiência de uso mostra que a ferramenta pode ser útil na criação de materiais de divulgação em conformidade com os limites éticos da publicidade jurídica, desde que utilizada com critério e propósito informativo.
A informação circula melhor quando não fica parada. Se esta edição da Jus Civile te trouxe insights, reflexões ou boas referências, considere compartilhar a newsletter com quem também se interessa por Direito bem pensado e bem explicado. Obrigado pela leitura e até a próxima! ⚖️📚