Jus Civile #27

Se manter atualizado é essencial na vida jurídica, e a Jus Civile torna esse processo mais fácil e dinâmico. Nesta edição, trazemos análises técnicas, conteúdo relevante e temas inovadores que impactam diretamente os profissionais do Direito. Pegue seu café e vamos juntos! ☕📖

Institutos

Culpa aquiliana

A responsabilidade civil é um dos pilares do Direito Civil, estruturando-se em dois grandes ramos: responsabilidade contratual e responsabilidade extracontratual. A culpa aquiliana, inserida nesta última, refere-se ao dever de reparar danos causados a outrem sem que haja qualquer vínculo jurídico prévio entre as partes.

Seu fundamento remonta ao Lex Aquilia de Damno, legislação romana que disciplinava a reparação de danos patrimoniais. No ordenamento jurídico brasileiro, a culpa aquiliana se expressa principalmente no Art. 186 do Código Civil, que dispõe que aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Dessa forma, basta a prática de um ato ilícito para que surja o dever de indenizar, desde que comprovados seus elementos essenciais. A configuração da culpa aquiliana exige a presença de três requisitos fundamentais:

  1. Ato ilícito: conduta voluntária que viole direito alheio (ação ou omissão culposa/dolosa).

  2. Dano: prejuízo material ou moral experimentado pela vítima.

  3. Nexo causal: relação direta entre a conduta ilícita e o dano sofrido.

Embora a culpa aquiliana tradicionalmente demande a comprovação de dolo ou culpa (responsabilidade subjetiva), há hipóteses em que se aplica a responsabilidade objetiva, fundamentada na teoria do risco e prevista expressamente em legislações específicas, como o Código de Defesa do Consumidor.

Na culpa aquiliana, o dever de indenizar decorre da simples constatação da conduta ilícita e do dano, independentemente de qualquer relação contratual prévia entre as partes envolvidas.

A aplicação da culpa aquiliana tem se expandido à medida que novas relações sociais e econômicas surgem. No campo do Direito Ambiental, por exemplo, a responsabilidade civil passou a abranger danos difusos e coletivos, muitas vezes sob a ótica da responsabilidade objetiva. No Direito Digital, discute-se a responsabilização por atos ilícitos praticados na internet, como ofensas em redes sociais e vazamento de dados pessoais. Diante dessas transformações, o conceito clássico de responsabilidade extracontratual continua a se desenvolver, exigindo da doutrina e da jurisprudência uma interpretação que assegure a efetiva reparação dos danos sem desconsiderar a evolução das dinâmicas sociais e tecnológicas.

Latim jurídico

Passim et passim

Imagem: criação Jus Civile

A expressão passim et passim pode ser traduzida como "aqui e ali" ou "em vários trechos". No meio jurídico, essa locução é utilizada para indicar que determinado assunto ou conceito está disperso ao longo de um texto, decisão judicial ou obra doutrinária, sem estar concentrado em um único ponto específico.

Seu uso é frequente em citações acadêmicas e jurídicas, especialmente quando se quer demonstrar que determinado tema foi tratado ao longo de uma obra, sem referência a uma página exata.

Exemplo de aplicação: "O tema da responsabilidade civil objetiva é abordado por Caio Mário da Silva Pereira, passim et passim, ao longo de sua obra sobre Direito Civil."

Assim, ao se deparar com essa expressão em um acórdão, parecer ou doutrina, saiba que o autor está sinalizando que a informação se encontra espalhada ao longo do texto citado.

Atualidades

Validade jurídica da assinatura Gov.br

A digitalização trouxe avanços significativos para a formalização de documentos, reduzindo burocracias e ampliando o uso de assinaturas eletrônicas. No Brasil, uma das ferramentas mais utilizadas é a assinatura eletrônica Gov.br, que permite assinar digitalmente contratos e documentos. No entanto, ela possui validade jurídica restrita, o que pode gerar dúvidas sobre sua real aplicabilidade.

A questão central é: a assinatura Gov.br pode substituir assinaturas manuscritas ou certificadas em qualquer contexto? A resposta é não. Embora tenha validade em interações com órgãos públicos, ela não é aceita para contratos privados entre indivíduos nem para documentos apresentados em processos judiciais.

A Lei nº 14.063/2020 regulamenta o uso das assinaturas eletrônicas no âmbito da administração pública e estabelece três tipos de assinaturas eletrônicas:

  • Simples: permite identificar o signatário, mas tem nível de segurança básico.

  • Avançada (Gov.br): vincula a identidade do usuário à assinatura e oferece maior segurança, mas só é válida para interações com o governo.

  • Qualificada: exige um certificado digital emitido por uma Autoridade Certificadora (AC) credenciada à ICP-Brasil e tem o mesmo valor jurídico de uma assinatura manuscrita.

Imagem: classificação das assinaturas eletrônicas, Suitebras Blog

O Art. 2º, parágrafo único, da Lei n° 14.063/2020, deixa claro que a assinatura Gov.br não se aplica a:

  • ❌ Processos judiciais.

  • ❌ Contratos e transações entre pessoas físicas e jurídicas privadas.

Ou seja, documentos assinados com Gov.br não possuem validade jurídica irrestrita e podem ser recusados em diversos contextos, principalmente no setor privado e junto ao Poder Judiciário.

Diferente da assinatura Gov.br, que possui validade limitada, a assinatura qualificada é emitida por meio de uma Autoridade Certificadora (AC), entidade credenciada pela Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP-Brasil).

Mas o que é uma Autoridade Certificadora? Trata-se de uma organização autorizada a emitir certificados digitais que garantem a autenticidade e integridade de assinaturas eletrônicas. Esses certificados são baseados em criptografia avançada, vinculando a identidade do signatário ao documento de forma segura e juridicamente reconhecida.

A ICP-Brasil é responsável por garantir que essas certificações sigam padrões rígidos, oferecendo segurança máxima para documentos assinados digitalmente. Assim, uma assinatura qualificada possui a mesma validade jurídica de uma assinatura manuscrita com firma reconhecida em cartório.

E quando a assinatura por meio do Gov.br pode ser utilizada?

  • ✅ Aceita: para assinar documentos administrativos, requerimentos e contratos com órgãos públicos.

  •  Sem validade jurídica: para contratos entre particulares (B2B e B2C), transações comerciais e documentos apresentados em processos judiciais.

Isso significa que, se um contrato for assinado apenas com a assinatura Gov.br e uma das partes questioná-lo judicialmente, ele pode ser considerado sem validade legal, dificultando sua execução.

Conclui-se que a assinatura Gov.br não pode ser usada indiscriminadamente. Sua validade jurídica está limitada ao setor público, não sendo aceita no setor privado nem no Judiciário. Assim, empresas e indivíduos que necessitam garantir a segurança jurídica de um documento devem optar por assinaturas qualificadas emitidas por Autoridades Certificadoras da ICP-Brasil.

InovAção

Engenharia de prompt: construção de recurso de agravo de instrumento com IA

A inteligência artificial tem transformado diversas áreas do conhecimento, e o Direito não é exceção. Ferramentas de IA podem auxiliar na pesquisa jurídica, na redação de peças processuais e na organização de argumentos jurídicos, tornando a prática advocatícia mais eficiente. No entanto, para obter respostas precisas e tecnicamente adequadas, é fundamental entender a engenharia de prompt.

A engenharia de prompt é a técnica de formular comandos claros, detalhados e estratégicos para obter respostas de IA mais eficazes e alinhadas com a necessidade do usuário. No Direito, um prompt bem elaborado pode auxiliar na construção de peças processuais mais robustas, garantindo que a IA considere aspectos essenciais, como fundamentação legal, jurisprudência aplicável e estrutura processual adequada.

Por sua vez, o agravo de instrumento é o recurso cabível contra decisões interlocutórias que possam causar prejuízo imediato à parte. Ele está disciplinado nos Ars. 1.015 a 1.020 do CPC e permite que o Tribunal reexamine a decisão proferida pelo juiz de 1ª instância. Em muitos casos, a urgência na interposição do recurso exige rapidez e precisão na redação, tornando a automação e o uso de IA ferramentas valiosas para advogados. Para auxiliar na construção de um recurso bem fundamentado e juridicamente sólido, construímos um prompt otimizado para a elaboração de um agravo de instrumento utilizando IA:

Prompt para o desenvolvimento de um agravo de instrumento (copie e cole esse texto em qualquer GPT para iniciar a elaboração da peça processual): "Atue como um advogado especialista em Direito Processual Civil e elabore um recurso de agravo de instrumento conforme o CPC, estruturado de forma técnica e persuasiva. Para isso, colete as seguintes informações essenciais: qual decisão está sendo recorrida e qual seu fundamento jurídico, qual juízo proferiu a decisão, número do processo, partes envolvidas e natureza da ação, se há pedido de efeito suspensivo e qual o risco de dano irreparável, além de quais provas e documentos são relevantes para instruir o recurso. Pesquise e inclua jurisprudência do tribunal competente para julgar o agravo, garantindo embasamento sólido e alinhado com o entendimento da corte. Organize o texto em uma petição formal, incluindo endereçamento ao tribunal competente, síntese da decisão recorrida, razões do agravo com fundamentação legal e jurisprudencial pertinente, pedido de efeito suspensivo, se aplicável, e conclusão com o pedido objetivo principal, que é a reversão da decisão agravada. O texto deve ser claro, preciso e técnico, garantindo a correta observância do CPC.”

Por que esse prompt é eficiente?

  • ✅ Coleta informações essenciais: garante que o recurso contenha os dados indispensáveis para sua admissibilidade.

  • ✅ Define uma estrutura clara: organiza a peça dentro do modelo processual exigido pelo CPC.

  • Inclui fundamentação legal e jurisprudencial: torna o recurso mais persuasivo e alinhado ao entendimento do tribunal competente.

  • ✅ Considera pedidos urgentes (efeito suspensivo): permite que o recurso tenha maior eficácia prática, evitando danos irreparáveis ao agravante.

A engenharia de prompt não substitui a atuação do advogado, mas se torna uma ferramenta estratégica para otimizar a redação de peças processuais, garantindo maior eficiência e precisão. No caso do agravo de instrumento, um prompt bem estruturado pode acelerar a elaboração do recurso, garantindo que a peça contenha todos os requisitos formais e materiais necessários para sua admissibilidade, aumentando as chances de sucesso.

📌 Dica final: Sempre revise e adapte o texto gerado pela IA, assegurando que ele esteja adequado ao caso concreto e às especificidades do tribunal onde o recurso será interposto.

Agradecemos por sua leitura e companhia nesta edição da Jus Civile! Nosso objetivo é tornar o Direito mais acessível, técnico e dinâmico. Se este conteúdo fez sentido para você, compartilhe a newsletter com quem também pode se beneficiar. Até a próxima! 😉⚖️